O enigma do tempo é um dos meus fascínios. A pressa pode pisotear flores. Mas a lentidão é represa na torrente de águas afoitas, abundantes, temerárias que ousam afrontar o próprio tempo. O tempo, essa bizarra dimensão misteriosa, a quem atribuem ser o velho Senhor da Razão, vez por outra, ensandecido, alucina os dias e as horas. Dele, diz ser Rei, a bela canção. E eu, rainha, a me contentar com migalhas de segundos que sobram de tantas eternidades já sonhadas, recito as palavras do Eclesiastes, um dos meus poemas bíblicos preferidos, depois de Salomão:
“Tudo tem o seu tempo determinado, e há tempo para todo o propósito debaixo do céu. Há tempo de nascer, e tempo de morrer; tempo de plantar, e tempo de arrancar o que se plantou; Tempo de matar, e tempo de curar; tempo de derrubar, e tempo de edificar; Tempo de chorar, e tempo de rir; tempo de prantear, e tempo de dançar; Tempo de espalhar pedras, e tempo de ajuntar pedras; tempo de abraçar, e tempo de afastar-se de abraçar;”
Mas qual o verbo do princípio conjugará pretéritos imperfeitos? Ou redigirá, como imperativo da alegria, o futuro do presente? Em qual tempo acontecerá o milagre da tranformação do Malbec em Água Perrier? A conversão do mármore em mel? Tempo de temperos e semeaduras? Ou, novamente, tempo de tempestades, que varrem a terra para surgirem novos húmos? Repilo o tempo de aconte(cimentos) petrificados. Quero o aconte-SER. Nós e os episódios somos frutas das quais a demora no tempo de colheita apodrece e o instante mágico da hora exata proporciona o sorver. A rotina asfixia os minutos. Mas o atraso e a demora também destroem o agora. A ausência é a indolência do tempo. Começo, meio e fim? Sem ponteiros no meu relógio, destruo as horas, mas acabo também com o fim. “,” (vírgula, como faria Clarice)
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