domingo, 30 de dezembro de 2012

Francisco de Assis e a roda dos acontecimentos



Era uma manhã de certo dia 20 de novembro que parecia dissolver a véspera áspera.  Um banheiro numa casa de praia me recepcionava, de forma excêntrica, com uma pequena imagem, talhada em madeira, de São Francisco de Assis. O santo iconoclasta do Capitalismo destoava do ambiente reservado aos mais íntimos e secretos rituais de higiene. Lembrei-me da velha frase da adolescência roqueira: “o banheiro é a igreja dos bêbados”. A ausência de embriaguez anunciava que meus próximos capítulos seriam de muita lucidez. Um clarão acompanhou-me durante  boa parte dos 365 dias de 2012, causando, por vezes equivocadas, desconforto em minha alma que tinha por hábito abrigar-se em becos escuros. Por décadas fui devota de Eros, cuja adoração, a partir de então, passava a ser substituída pelo singelo São Francisco.

Uma digressão precisa ser feita: reza a lenda que, numa noite, Psiquê apaixonada pelo amante Eros que o visitava todas as noites de escuridão, resolve acender uma vela para enxergá-lo. Ele, ao ter a sua identidade revelada, foge para longe. A partir então, Psiquê passa a vagar pelo mundo numa eterna e desenfreada busca pelo amor perdido. Uma busca de toda uma humanidade trôpega, à procura do desejo. Já São Francisco, sintetiza a máxima reveladora da Lei do Retorno: “é dando que se recebe”. Ele nos impele a uma comunhão universal, em que cada um contribui com uma cota de amorosidade que se conecta e irradia em uma grande rede de alta tensão do Bem. O enunciado é lógico. No teorema de nossos gestos, recebemos aquilo que damos, ainda que o emissor seja alguém diferente de quem já damos. A mensagem franciscana é encontrada em diversas filosofias, a exemplo do Taoísmo, com o mesmo sentido original.

Eros e São Francisco se apresentam antagônicos. Um se manifesta na escuridão e outro é luminosidade, a irradiar-se pela Teia Universal. Francisco é real e Eros é mito. O primeiro se despe das amarras da materialidade para melhor se expressar, em liberdade. O segundo se manifesta de modo oculto e demanda uma busca insana, quase sempre sem ter fim, apenas substituída por outra procura. É assim que grande parcela das pessoas classificam o que rotulam de “amor”. O amor, se fosse cego, não exigiria que o amado se presentificasse.

Corrompidos vêem na máxima franciscana um jogo de interesses e de trocas. Do ponto de vista da Lei de Ação e Reação, recebemos exatamente aquilo que damos. O ciclo que envolve a roda dos acontecimentos é movido por tal engrenagem. Basta estar atento aos movimentos para perceber.

Eu jamais poderia menosprezar a presença daquela escultura minúscula de Francisco de Assis, testemunhando a minha primeira manifestação fisiológica, na manhã de um domingo claro de sol. Ao me deparar com a imagem, cheguei a pensar que se tratava de Santo Antônio, o casamenteiro. Mas a artimanha do destino foi ainda mais sagaz do que eu poderia imaginar.  

sábado, 29 de dezembro de 2012

Dica de Reveillon

sexta-feira, 28 de dezembro de 2012

Balanço em um conto hábil



2012 encerra seu ciclo, preparando-se para fechar as cortinas. Um ano de sacrifícios, de dedicação quase integral às tarefas laboriosas. Noitadas e celebrações dionisíacas foram abolidas e substituídas por horas de viagem, por textos produzidos e por muito, muito esforço intelectual. Sinto-me em bom condicionamento profissional, quase uma maratonista. Optei pelo caminho do trabalho duro, da busca consistente que a cada dia se distancia dos atalhos fáceis escolhidos por tantos que se perderam no caminho. Não, ainda não me achei e, tampouco, possuo esta ambição. Ser buscadora alimenta meu espírito. Prossigo com a consciência alargada de que a Vida nos retorna exatamente aquilo que ofertamos a ela – mesmo quando o Divino Mistério Profundo nos açoita de dor, com sua Matemática Celestial.
Meses equivalentes a passos de muitos quilômetros percorridos. Dias que foram tragados com força. Tive duas vitórias profissionais importantes, editei jornais, fiz roteiros de vídeos, produzi Cadernos Especiais, dei consultorias e algumas palestras, ganhei uma sobrinha linda com nome de música de Tom Jobim, Isabella, para fazer côro a outras belas composições de nossa família, Luísa e Clara.
Neste texto com sotaque de Danuza Leão e pitadas de Martha Medeiros, ouso confessar que consegui quitar um apartamento, decorado com meu abençoado suor. Abuso da escrita feminina para dizer que escrevi poucas cartas para mim mesma, vi zilhões de filmes (pra variar) e li alguns livros, menos do que deveria em função da aridez da agenda, muitos escolhidos por dialogarem com meus interesses do momento, a exemplo de Os Últimos Soldados da Guerra Fria, de Fernando Morais e outros. Não publiquei meu livro, adiado para mais uma lista das resoluções do Ano Novo, nem resolvi estudar em outro País – ficando mais este item para incluir nos próximos anos. Viajei pouco para fora do Estado e, inclusive, quase não viajei para dentro de mim mesma. Voltei ao lugar em que todos pretendem se esbaldar na juventude, mas onde escolhi para me aposentar, o Rio de Janeiro e viajei de carro até a bela e afrodisíaca Jericoacoara, no Ceará (Uau! Diria o mais voyeur dos leitores!). Desintoxiquei-me em rios e praias desertas, exercitando o xamanismo pessoal. Fiz pouco para o tanto que pulula dentro de mim. Mas sobrevivi à mais desafiante e extraordinária aventura humana, a própria Vida. Inteira. Melhor. Mulher.
E com um detalhe: este ano resolvi abolir alguns Especiais de Roberto Carlos que se repetiam sempre em minha vida. “O importante é que emoções eu vivi!”. Saúde, 2013!

domingo, 16 de dezembro de 2012

FELIZ 2013

terça-feira, 20 de novembro de 2012

Drummond no Dia


Campo de Flores

Deus me deu um amor no tempo de madureza,
quando os frutos ou não são colhidos ou sabem a verme.
Deus-ou foi talvez o Diabo-deu-me este amor maduro,
e a um e outro agradeço, pois que tenho um amor.
Pois que tenho um amor, volto aos mitos pretéritos
e outros acrescento aos que amor já criou.


Eis que eu mesmo me torno o mito mais radioso
e talhado em penumbra sou e não sou, mas sou.
Mas sou cada vez mais, eu que não me sabia
e cansado de mim julgava que era o mundo
um vácuo atormentado, um sistema de erros.
Amanhecem de novo as antigas manhãs
que não vivi jamais, pois jamais me sorriram.
Mas me sorriam sempre atrás de tua sombra
imensa e contraída como letra no muro
e só hoje presente.


Deus me deu um amor porque o mereci.
De tantos que já tive ou tiveram em mim,
o sumo se espremeu para fazer vinho
ou foi sangue, talvez, que se armou em coágulo.
E o tempo que levou uma rosa indecisa
a tirar sua cor dessas chamas extintas
era o tempo mais justo.


Era tempo de terra.
Onde não há jardim, as flores nascem de um
secreto investimento em formas improváveis.
Hoje tenho um amor e me faço espaçoso
para arrecadar as alfaias de muitos
amantes desgovernados, no mundo, ou triunfantes,
e ao vê-los amorosos e transidos em torno,
o sagrado terror converto em jubilação.
Seu grão de angústia amor já me oferece
na mão esquerda.


Enquanto a outra acaricia
os cabelos e a voz e o passo e a arquitetura
e o mistério que além faz os seres preciosos
à visão extasiada.
Mas, porque me tocou um amor crepuscular,
há que amar diferente.


De uma grave paciência
ladrilhar minhas mãos.


E talvez a ironia
tenha dilacerado a melhor doação.


Há que amar e calar.
Para fora do tempo arrasto meus despojos
e estou vivo na luz que baixa e me confunde.

segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Mandados de Mia Couto.

quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Obama e o Mundo

Afora o ufanismo exacerbado, característico dos filhos de Tio Sam e do seu complexo de “Umbigo do Mundo”, Barack Obama mais uma vez se consagrou pela oratória voltada a captar e expressar os anseios coletivos. A retórica presidencial faz falta aos nossos líderes tupiniquins, dos quais tão recentemente fomos plateia para apelos e tropeços gramaticais do bom, velho e pop Luiz Inácio Lula da Silva. Ao seu modo, Lula soube falar a língua do povo, com metáforas de gosto duvidoso e declarações infames, mal ajambradas para a boca de um presidente. Coisas do Brasil de Macunaíma e Zeca Pagodinho.
Pois bem, Obama não cumpriu a promessa de fechar Guantánamo, a prisão norte-americana localizada na Ilha de Cuba, símbolo de atrocidade e, segundo declarou a Anistia Internacional este ano, “de atentado aos direitos internacionais”. Já são dez anos de arbitrariedades contra a humanidade e da promessa feita pelo presidente norte-americano, em sua primeira eleição, só restou o verniz de mais um belo discurso, em entrevista ao programa 60 Minutes, da rede de televisão americana CBS, quando ele declarava que fecharia a prisão de Guantánamo para recuperar "a estatura moral dos Estados Unidos no mundo". Barack não comprou a briga. E também exagerou ao afirmar, sobre a morte de Bin Laden, que valeram os esforços para “tornar o mundo melhor”. Mas em mais um episódio soube capitalizar o sentimento da nação.
O puritanismo estaduniense rende-se ao multiculturalismo mundial e às megatendências de comportamento, em uma era que não tolera mais a própria intolerância, seja ela de orientação sexual, social, racial ou outra. O primeiro presidente negro da América é um produto desta contemporaneidade alargada e sabe como descrever sua época, quando afirma: “It doesn't matter whether you're black or white or Hispanic or Asian or Native American or young or old or rich or poor, able, disabled, gay or straight, you can make it here in America if you're willing to try”.
Ele discursa como estadista, quando afirma: “Nós somos maiores do que a soma das nossas ambições individuais.” E se suas palavras integrassem o repertório de práticas e ações dos líderes mundiais, em especial da classe política brasileira, a propalada Reforma Política começaria por um novo perfil de homens públicos. Marx Weber já anteciparia o fulcro do significado da política: “por os dedos entre os raios da história”.

terça-feira, 6 de novembro de 2012

A base biológica da espiritualidade


Assinalamos anteriormente, nestas páginas, que o espírito representa a dimensão do profundo humano. Espiritualidade que dele se deriva é um modo de ser, uma atitude fundamental, vivida na cotidianidade da existência: na arrumação da casa, no trabalho na fábrica, dirigindo o carro, conversando com amigos. De repente, irrompe como que um lampejo de algo mais profundo e inexplicável. É o espírito que se anuncia. As pessoas podem conscientemente se fazer abertas para o profundo e para o espiritual. Então se tornam mais centradas, serenas e irradiadoras  de paz. Propagam estranha vitalidade e entusiasmo porque têm Deus dentro de si.  Este Deus  interior é amor, o qual nas palavras de Dante, no final de cada livro da Divina comédia, “move os céus e as estrelas”,  — e nós acrescentamos: e nossos próprios corações.
Esta profundidade espiritual, dizem pesquisas científicas, tem uma base biológica. Realizadas do final do século 20 e conduzidas pelos neuropsicólogos MichaelPersinger e Ramachandran, pelo neurologista Wolf Singer e pelo neurolinguista Terrence Deacon, outrossim por técnicos usando scanners modernos para fazer imagens cerebrais, detectaram o que eles chamaram de “o ponto de Deus no cérebro” (God spot ou God module).
Pessoas que em suas vidas deram espaço significativo ao profundo, ao espiritual, revelam nos lóbulos frontais do cérebro uma excitação detectável acima do normal.  Estes lóbulos são ligados ao sistema límbico, o centro das emoções e valores. Aí se dá uma concentração naquilo que tais cientistas chamaram de “mente mística” (mystical mind).  Tal estimulação do “ponto de Deus” não está ligada a uma ideia ou a algum pensamento objetivo. Ele é ativado sempre e quando a pessoa se sente emotivamente envolvida com os contextos globais que conferem sentido à vida ou quando, de forma autoimplicada, se referem ao Sagrado, a temas religiosos ou diretamente a Deus. Trata-se de emoções e não de ideações, de fatores ligados a experiências de grande sentido que implicam um percepção do Todo e de algo incondicional.
Estudos mais recentes apontam que pode haver de fato não apenas uma mas  múltiplas regiões do cérebro estimuladas pela experiência de totalidade  e de sacralidade. Isso indica que o “ponto de Deus” pode ser, na verdade, uma “rede de Deus” compreendendo regiões normalmente associadas a emoções profundas e carregadas de significação.  Outros pesquisadores como Eugene D’Aquili e Andrew Newberg chamaram a esta realidade, como temos referido acima, a  ”mente mística”.
Esta mente mística pertence ao processo mais geral,  antropogênico-cosmogênico. Ela representa uma vantagem evolutiva da espécie homo. Como externamente somos dotado de sentidos pelos quais apreendemos a realidade através do ouvido, do olho, do tato e do olfato, assim seríamos internamente enriquecidos com um órgão pelo qual captamos o Mistério do Mundo, o que nos faz sensíveis àquela Energia poderosa e amorosa que perpassa de ponta a ponta todo o Universo e que subjaz à nossa existência. As tradições religiosas a chamaram de Deus.
Se ela está em nós  e nós somos parte do Universo, significa então que esta inteligência espiritual constitui uma propriedade do próprio Universo. Só porque está no Universo pôde estar em nós.  É por esta razão que a filósofa e física quântica Danah Zohar e o psiquiatra Ian Marshall afirmam que o ser humano não é apenas dotado de inteligência intelectual e emocional, mas também de inteligência espiritual. Esta é um dado de realidade com o mesmo direito de cidadania que a libido, a autoafirmação, a inteligência e o amor (QS: inteligência espiritual – Record, 2000).
Hoje faz-se urgente, mais que antes, dar realce à inteligência espiritual. Porque vivemos numa cultura entorpecida pelo materialismo e pelo consumismo induzido. O efeito deste modo de ser é bem relatado pela literatura contemporânea: sentimentos de náusea (Sartre), de estar-de-sobra (Marcel), de alienação (Marx), de “derelição-abandono”(Heidegger), de estrangeiros na própria pátria (Camus). Numa palavra, padecemos de graves doenças de sentido como denunciaram os psicanalistas Rollo May e Victor Frankl. Tudo isso porque embotamos a inteligência espiritual.
A espiritualidade nos ajuda a sair desta cultura doentia e agonizante. A integração da inteligência espiritual com as outras formas de inteligência — intelectual e emocional — nos abre para uma comunhão amorosa com todas as coisas e para uma atitude de respeito e de reverência face a todos os seres, muito mais ancestrais do que nós.  Só assim, poderemos nos reintegrar no Todo, sentirmo-nos parte da comunidade de vida e acolhidos como companheiros na grande aventura cósmica e planetária.
* Texto escrito por Leonardo Boff, escritor, teólogo e filósofo.

quinta-feira, 1 de novembro de 2012

DOCE NOVEMBRO

domingo, 30 de setembro de 2012

Poema de 7 fases


Tenho fases
Sou de Lua
Guardo frases
Em certas páginas
 Notas de rodapé
Afora os aforismos, guardo excessivos lirismos.
Acordes musicais
De Martinho da Vila a Mia Couto
Um mundo pra mim é pouco.


quinta-feira, 20 de setembro de 2012

TV Escrita

sexta-feira, 14 de setembro de 2012

Um outro reinado


Abomino proselitismos religiosos. Mas a figura de Jesus Cristo, doce e repleta de magnetismo, sempre me intrigou. As metáforas divulgadas, ao longo de mais de dois mil anos, a poesia que desabrocha, visualmente e textualmente, em diversos episódios de sua breve passagem pela Terra são fascinantes.

O Novo Testamento parece escrito por um brilhante roteirista, com a inserção, inclusive, de efeitos especiais. A cena de Jesus caminhando sobre as águas é uma das mais poéticas de todo a narrativa bíblica. Uma imagem que transmite a fluidez e a leveza tão essenciais aos nossos anos de encarceramento no corpo carnal. As frequentes transmutações pelas quais precisamos operar em  nossos enfrentamentos diários, a água em vinho, pedras em pães, a possibilidade de nos libertamos da nossa cegueira voluntária e tantas outras mensagens sob o manto do simbolismo.
De todos os ensinamentos do Cristo, um dos meus preferidos é aquele que teria sido relatado por Marcos: “Pois, que adianta ao homem ganhar o mundo inteiro e perder a sua alma?”. Em uma assertiva que reforça o mesmo conceito ele responde à irônica pergunta de Pilatos sobre se era o rei dos judeus: “Meu reino não é deste mundo. Se o meu reino fosse deste mundo, a minha gente houvera combatido para impedir que eu caísse nas mãos dos judeus; mas, o meu reino ainda não é aqui”.
O nosso reinado mundano é transitório, perecível e com uma data de validade que não conhecemos. O mestre propõe o aviltamento das coisas que, equivocamente, valorizamos em demasia durante a breve passagem pela Terra. Ele nos sugere retirar os excessos da bagagem para que a subida seja mais leve, para que o Caminho Sagrado, que resume a jornada existencial, seja percorrido de modo mais fácil.  

Penso nas nossas mais íntimas obsessões, cultivadas e alimentadas por nós, como se fôssemos viver para sempre ou como se determinados momentos não fossem evaporar-se com o passar dos dias, meses e anos, eternizando-se apenas em nossa memória. Há os que amontoam fortunas, assemelhand0-se aos portadores de transtornos obsessivos que guardam entulhos em casa. Os que ganham o mundo e perdem a ternura vital, asfixiando-se de si memos. E os compulsivos por determinos temas, pessoas ou manias. Jamais conseguiriam "andar" sobre as águas do mar.

Jesus reafirma a ideia de um reinado diferente, na outra dimensão, com outro ensinamento: “Não acumuleis para vós outros tesouros sobre a terra, onde a traça e a ferrugem corroem e onde ladrões escavam e roubam; mas ajuntai para vós outros tesouros no céu, onde traça nem ferrugem corrói, e onde ladrões não escavam, nem roubam; porque, onde está o teu tesouro, aí estará também o teu coração.”

Eis a explícita lição do desapego e da impermanência daquilo que é desnecessário. Quando a inexorável senhora Morte chega, sem hora marcada, joga fora nossos "tesouros", transformando "grandezas" em insignificâncias. 

Os que ardem na fogueira das vaidades são equivocados. Eles esquecem que a festa acaba, às vezes quando menos esperamos. Talvez eu já tenha vivido mais do que a metade dos anos que me foram concedidos aqui nesta dimensão. O suficiente para optar por ser exatamente assim: uma mochileira da existência. Nos embates contra os arrogantes, meu ideal sempre esteve mais próximo da poesia da Mário Quintana; "...ele passarão e eu passarinho"

Nunca almejei a riqueza, o luxo ou ser uma celebridade. Nem luxo, nem lixo, conforme a receita da titia Rita Lee. E fiel ao preceito barthesiano, dos meus preferidos: “Nada de poder, um pouquinho de saber e o máximo possível de sabor”

Pretendo acumular cada vez menos excessos na bagagem, ao som do velho Tim Maia: “não quero dinheiro, quero amor sincero”

domingo, 9 de setembro de 2012

Pé de Jazz

segunda-feira, 20 de agosto de 2012

O “novo” Óleo de Peroba nas Eleições de São Luís


Em meio a um engarrafamento de uma São Luís estacionada, um adesivo colado no pára-choques do carro dianteiro, exibe a frase: Castelo de novo! Numa época em que a Galáxia de Gutemberg tornou-se apenas uma expressão romântica, na era dos bilhões de acessos instantâneos, da profusão ininterrupta de informações, quando o último post começa a caducar em poucos segundos, o que seria mesmo o “novo”? O apogeu da Sociedade em Rede, das tendências do mundo hype, dos impactos da Modernidade Líquida traz a nítida impressão de que não existe mais nada de “novo” na Hiperconectividade Global.
A palavra “novo”, aliás, de tão surrada, parece não surpreender nem o mais brilhante texto publicitário. O slogan castelista chama tanta atenção quanto o “Novo Sabão OMO” e, ao contrário de seus sinônimos (“recente”, “jovem” e “moderno”) remete justamente à ideia de enfadonho. A sabedoria popular define com precisão o mal estar impregnado no termo: “De novo, toda hora!”.  
O apelo ultrapassado cai bem em uma eleição de castelos e palácios que remontam à idade medieval ou de candidatos que já foram tão socialistas quanto a capital dos Estados Unidos, Washington. Os marqueteiros ávidos por transformar sapos em príncipes, castelos e palácios em modernos duplex com vista para o mar, Holandas em Anjos da Guardas enfrentarão o desafio de filmar Fidel Castro fazendo propaganda do Mc Donald’s.
A crise do “novo” no marketing eleitoral nas eleições de São Luís se estende para as alianças e composições das chapas. O “novo” para balancear a candidatura de Castelo seria um Neto, o Evangelista, herdeiro político do pai e da coincidência de origem do seu nome, Evangelho, do grego Evangelion, que significa “boa nova”. Em contraponto, o “novo” Edvaldo Holanda Júnior, que também sucede o genitor na militância, carrega o fardo de um Roberto Racha, digo, Rocha, versão remixada de um velho pagode político.
Enquanto os carros de som esgoelam jingles plagiados, sob encomenda, a inchada ilha de São Luís sofre com a diarréia da festa de seus 400 anos, despejando fezes nas baías e vomitando carros, destinada a se reduzir a um Beco da Bosta, sem planejamento urbano e iniciativas criativas.

Infelizmente, ainda não inventaram um S.A.C. (Serviço de Atendimento ao Consumidor) para os neófitos no Marketing Político que, esquecendo do fator humano, traçam suas estratégias como se estivessem fazendo propaganda do “Novo” Sabão Omo ou do popularmente conhecido Óleo de Peroba.

quarta-feira, 18 de julho de 2012

Oração Matinal

quinta-feira, 12 de julho de 2012

No princípio sempre foi o verbo




Faz quase um ano. Recebi um apelo delicado que, aos meus ouvidos corrompidos pelo bafo da maledicência mundana, soou como uma severa advertência. Veio em forma de quase segredo, ditado por uma das minhas maiores referências na condição humana, José Bezerra, meu avô, que no vigor de seus 97 anos, me disse: “Quero lhe fazer um pedido. Não largue a pena!”. Seu Bezerra, em frase machadiana, me pedia para não parar de escrever.

Aos desavisados, a petição parecia equivocada a quem escolheu o heróico e mal pago ofício da escrita que esgrima injustiças sociais, da palavra que fornece voz à realidade da pobreza muda, enfim, de quem optou por aquela que um dia já foi a romântica profissão de jornalista. Embora os últimos anos tenham sido de muitas desilusões amorosas diante daquilo que a jornalista Marilene Felinto chama de “blefe” e “jogo de cartas marcadas”, que é o jornalismo contemporâneo, não havia como ser infiel a toda uma existência rabiscada pela escrita.

Os livros didáticos de papai e mamãe (ambos professores. e de Língua Portuguesa!) ainda estão na estante deles, pichados com meus desenhos e letras infantis, feitos às escondidas, surpreendendo meus pais durante as aulas. Os poemas escritos por mim para o Dia das Mães, aos 7 anos, com rimas insípidas “Teus cabelos cor de ouro, teus olhos cor do mar, de tanto eu te amar” - também denunciavam o destino traçado para a devoção à escrita. Aos 11 anos, meus cadernos do Colégio Batista eram preenchidos por frases de temas que em nada dialogavam com as disciplinas ministradas em sala de aula. As colegas mais velhas, alunas do meu pai, estranhavam a minha excentricidade, relatada em textos como: “Vermes passeiam em minhas circunvoluções cerebrais”.

Quando fiz o Teste Psicotécnico do Detran, aos 18 anos, resolveram pedir uma redação com o tema Quem Sou Eu. Não deu outra: todos foram liberados, após alguns minutos, mas o psicólogo pediu que ficasse apenas eu para conversar com ele. Nenhum distúrbio psíquico. Apenas a minha afeição pelas palavras, no auge da empolgação juvenil, impulsionando-me a escrever um pouco mais do que os outros e provocando a curiosidade do profissional.

Nostalgias à parte, com a necessária redução da taxa de glicose neste post, eis me aqui, escrevendo. A produção espontânea, não remunerada, escrita para mim mesma ao longo dos anos e agora exibida sem pudor literário na possibilidade de um Blog, escasseia em alguns períodos, mas jamais cessa.

Clarice Lispector dizia que “escrever implicar em desnudar-se”, um exercício de autoconhecimento, um derramar dos vestígios si mesmo no confessionário sagrado de cada texto.

A escrita nasce impregnada daquilo que se absorve com os olhos, com o nariz, com os ouvidos, ferramentas do invólucro carnal que se conectam à alma escrevente. Escreve-se com a matéria-prima do viver cotidiano, com a substância extraída de livros, filmes, músicas, conversas, pessoas e dos episódios. Escrever é um necessário hábito solitário. Já devo ter perdido bons textos em muitos momentos de absoluta imbecilidade social, de frivolidades festivas.

Escrever é vital porque, conforme um dos poetas da minha devoção, Carlos Drummond de Andrade, “vivemos entre palavras e palavras somos”. 


Obrigada, meu amado vovô Bezerra, talvez eu jamais consiga conter essa multidão de palavras dentro de mim, pedindo para sair. Que assim seja!



domingo, 8 de julho de 2012

Post it!


A MINHA FELICIDADE

Depois de estar cansado de procurar
Aprendi a encontrar.
Depois de um vento me ter feito frente
Navego com todos os ventos.


(Friedrich Nietzsche, in "A Gaia Ciência)


quarta-feira, 4 de julho de 2012

Linhas do Destinatário

quarta-feira, 27 de junho de 2012

AutobioFlavia



Esse meu gosto por opostos
essa mania de contrastes.
Não, nunca me contrate
jamais aposte.
Em mim, é pura sorte.
O contraditório desfila no meu auditório.
tímida e míope
melan - cólica e lírica
insuportavelmente feliz
sempre por um triz
doce e travosa
amarga e gostosa
urtiga de seda
amante das palavras
livros e livre
café e paixão
sal e lama
inocente e indecente
universo denso, com incenso
formigas no espírito
água por natureza
alma de mochileira
misantropa, ma non troppo
ermitã e tantã.
sempre na contramão
matéria-prima de amorosidades suaves
o eco das risadas de Maria Clara e Luísa Valente

E Isabella, o mais novo raio de sol na janela
o olhar singelo do avô da minha vida
a última Flor do Lácio que papai me deu
a lã protetora da minha mãe Dolly em meu espírito sem abrigo

as saudades e maldades do coração ladrão
Mon Chouz, you, usted que nunca esteve e agora sempre, sente.
os vinhos filosóficos, a dança dos encontros...
a Vida, generosa, escandalosa
e tanto faz, tanto mais...
Como Pessoa: “Seja eu leitura variada para mim mesmo”

quinta-feira, 21 de junho de 2012

Tela de Karina Albuquerque


As pinceladas suaves, com leve toque erótico, resultam do talento de Karina Albuquerque, uma jovem de 25 anos, representante da nova geração de artistas plásticos maranhenses. Auto-didata, ela jamais frequentou escolas de belas artes, pintando como se escutasse a voz de sua intuição. 


A tela reproduz o descanso feminino, pós-gozo, que na acepção dos franceses remete ao significado de "quase morte".


Anônimas, exaustas e próximas da morte, nós mulheres alcançamos a utópica paz para nossas angústias e inquietações. São nestes efêmeros segundos que iludimos a ideia de saciedade de nossos intermináveis desejos, personificados no corpo labirintíco, oferecendo uma meia-resposta, em susurro, à clássica pergunta freudiana: "o que quer uma mulher?". 

Quem souber, morre, por alguns minutos.

quinta-feira, 14 de junho de 2012

Para que verve?


A ausência da escrita em quem faz dela um ingrediente vital é uma ausência de si mesmo. Pessoas, Clarices e outros mitos literários enfrentaram tal drama, nos seus momentos de insuficiência. Não se bastam os que recorrem à palavra, não são suficientes, somente a linha da escrita os preenche. O ato de escrever – ainda que se constitua um constante vir a ser, processo impermanente e inacabado por essência - tem o poder de demarcar territórios, de fundação das pequenas cidades feitas de nossas concepções, do estabelecimento das próprias leis, do arquitetar de sentimentos, do projetar ruas, avenidas e vielas por onde deverão trafegar nossos pontos de vista e de todo um movimento no sentido de quem ousa ser deus.
Sim, escritores são semi-deuses de suas próprias palavras, estas flechas poderosas, emitidas por arqueiros que escrevem, aliando força e habilidade, precisão e emoção e, sobretudo, com pulsação. Palavras também podem ser como pincéis: tons pastéis ou vermelho hemorrágico, abstracionistas, expressionistas, em textos sisudos ou desavergonhadamente exibicionistas.
Ainda que incontestável seja assim, alguns dias têm aspecto de musgo. A criação assume forma de pedra. As engrenagens enferrujadas dos ofícios repetitivos corroem a liberdade e condenam à morte a vida sob a asfixia da rotina. Mas os que sobrevivem como portadores de uma familiar compulsão pelo dito-escrito não conseguem, por muito tempo, permanecer sob a tirania da obviedade estabelecida. A rotina é letal. As letras são meu antídoto, palavras são meu “veneno antimonotonia”. Com elas, a vida volta a dançar!













quarta-feira, 6 de junho de 2012

Poeminha do Contra

sexta-feira, 18 de maio de 2012

Vadias, Uni-vos!


I Marcha das Vadias de São Luís
Data: 26 de Maio
Horário: 13h
Concentração: Av. Litorânea (Bar Raízes)