terça-feira, 30 de novembro de 2010

Conto de Facas


Era uma vez uma história sem sim.

De um conto sem fadas.

De um ponto sem fim.

Era uma vez uma história de bruxas que transformam o destino em sapo.

De um príncipe do princípio que cai no precipício.

Era uma vez que não teve vez.

E foram infelizes para sempre.

Até que a morte os inocente.

E a paixão os separe.

Eterna-mente.

segunda-feira, 29 de novembro de 2010

Em cartaz


São Luis recebe, pela primeira vez, a 5ª edição da Mostra Cinema e Direitos Humanos na América do Sul. A programação tem início hoje (29/11) e prossegue até o domingo (5/11), no Cine Praia Grande. A entrada é gratuita. No evento de abertura, marcado para às 19:30h, haverá a exibição de um curta-metragem e do longa PERDÃO MISTER FIEL, de Jorge Oliveira. Pela primeira vez, um documentário mostra como morreram alguns jovens que se rebelaram contra o terror da Ditadura. Entrevistas com trinta personalidades brasileiras, entre presidentes de estados, historiadores, escritores, ex-presos e exilados, contando suas experiências pessoais e analisando o contexto político nacional e internacional que motivou a barbárie da Ditadura Militar.

Para quem vive à míngua, sobrevivendo com parcas opções no quase sempre previsível cardápio cultural de São Luís, a programação é a melhor pedida da semana. Hora de exorcizar vampiros, seus Crespúsculos e Luas Novas, a sugarem o cérebro da pobre meninada! Uma boa dose da crua realidade documental fará bem às mocinhas e rapazes que imaginam ser o mundo cor-de-rosa bebê, como seus quartos de dormir.


Amor: gênero literário?


Não deve existir sentimento que reúna uma multiplicidade maior de clichês do que aquele cuja temática é objeto incansável e atemporal na história da humanidade: o amor. Ortega y Gasset escreveu que o amor parece um gênero literário. A jornalista e escritora Rosa Montero alerta:“quanto mais frustrado, mais impossível, mais irreal, mais inventado for o relacionamento sentimental, mais possibilidade tem de servir como estímulo literário”. No terreno pop, Zeca Baleiro desanca as convicções mais dramáticas, com o versinho: “morrer de amor não é difícil, se atirar do edifício, viver de amor que é difícil...”

Difícil é viver o amor. Para o exercício amoroso, muitas vezes costuma-se decorar fórmulas complicadas para aplicar aos testes mais fáceis, enfeitar o amor de trajes de gala, quando a ocasião é um simples passeio nas tardes de feriado. Quem somos, afinal, para aprisionar em conceitozinhos arrogantes, cristalizados, encarcerar nas grades mentais, em nossos padrões repetitivos, o que se chama amor? Somos todos uns déspotas, perdendo as horas que não voltam mais. Tom Jobim deve ter sentido a mesma coisa quando cantava “Insensatez” ou “Sua Estupidez”.

Ah, pieguice tão perseguida, tão indecifrável! Amor que poderia alçar vôos mais altos ou pousar, suavemente, sem o desfecho trágico de Ícaro que, apaixonadamente equivocado, voava para a própria morte, em direção contrária à liberdade. Amor que se alimentaria de gestos simples, como aquela peixada fictícia, feita de carne de sereia, cujos cantos afogam navios e destroem destinos. Ou numa viagem a Natal, quando ainda é Carnaval, até chegar a véspera da mesa farta que não sacia nenhuma fome, com migalhas arrotadas como se fossem caviar.

Em algumas desilusões amorosas, ouvi pessoas dizerem: “você vai encontrar um outro amor, logo passa”. Não, definitivamente, amor não é um pote de ouro que a gente encontra no final do arco-íris. Depois do final, tem mais e mais: potes, vasilhas, taças, xícaras, ouro, prata, cristal, bijuterias e uma enorme quantidade inutilidades. No amor, meu gênero não é mais literário, nem plural. É singular. Emaranhados não são laços. E a cada ano que passa, sinto-me cada vez mais como o Especial de Fim de Ano da Globo. Nem Lacan, nem Dostoéivski: Roberto Carlos. Amor. Simples assim!

quinta-feira, 25 de novembro de 2010

A nobreza do silêncio


A lua brilha porque alta vive” - repetiu os versos de Fernando Pessoa, numa tradução pessoal, translúcida. Ela costumava utilizar o silêncio como abrigo, em uma espécie de culto, durante suas práticas para acolher a si mesma. Dizia que era protegida pela nobreza do silêncio, nos momentos ensurdecedores, quando punhais afiados perfuravam seu coração. Os dedos miúdos, feito pincéis, folheavam o Alcorão, a Sutra Sagrada, jogavam I Ching, na busca frenética por um lenitivo para a angústia tão estranhamente familiar. Na Bíblia, encontrou apenas vestígios que a remetiam novamente às capsulas de silêncio que engolia para aliviar o ardor: “o mal não merece comentário em tempo algum”. Repetia baixinho.

O silêncio é uma orquestra – elaborou ao apreciar melodias mudas em perfeita harmonia a bailarem agora em seu pensamento liberto. A menina temia os ruídos. O tumulto provocava feridas em seus ouvidos frágeis e calava o fiapo de voz que nela restava.

Eles não sabiam, mas ela carrega uma nostalgia encolhida na alma, caminhando amedrontada por entre restos mortais de corpos insepultos, após a Guerra. Destroços. Cadáveres mutilados. Populações inteiras arruinadas. Uma civilização desaparecida.

O rugido dos estilhaços cedera lugar ao silêncio triunfante. Cessavam as respirações ofegantes. Apenas nublava, onde outrora chovia, torrencialmente, no céu de pano. Não havia mais asperezas na alma que emergiam à superfície. Sem mais tormentos a transfigurarem-se nos vermes que passeavam em suas circunvoluções cerebrais. Somente a plenitude, silenciosa, reinava absoluta, feito musgo em pedras.

A solidão se aconchegava à mansidão e caminhavam juntas, entrelaçadas, vitoriosas. A menina, então, mergulha na imensidão do silêncio. Surda aos gritos, abafados pela distância dos dias a atravessarem o eco do tempo.

segunda-feira, 22 de novembro de 2010

Cruelmente delicados


Conheci Rolando Toro em uma praia chamada Tabuba, no litoral cearense, banhada pela música do mar e dos pássaros e protegida por uma lua crescente a iluminar um grupo de pessoas que adotava um estilo de vida repleto de amorosidade. Toro, o criador da Biodança, um antropólogo chileno, psicólogo, poeta, professor de Antropologia Médica da Escola de Medicina da Universidade do Chile e amante da existência, falava da sacralidade da Vida e de uma espécie de religiosidade existente nos encontros. Na época, aos 81 anos, Rolando Toro dizia, com o castelhano sedutor que fluía de suas palavras, coisas como: “O abraço é uma celebração divina” ou “um olhar amoroso provoca uma explosão no sistema endócrino”.

Ainda lembro do entusiasmo que pulava dos meus olhos, quando conheci a proposta de viver abundantemente, apresentada a mim por duas bruxas em minha vida, Carime Jadão e Viviane de Araújo, ambas especialistas em Educação Biocêntrica – proposta educativa que coloca a vida em um lugar central. Todas as ocasiões em que me sinto triturada, moída pela máquina impiedosa do cotidiano ou pressinto o amargar da decepção na boca, recorro a tais ensinamentos. Cada dia me convenço de que o tema, aparentemente meio woodstockiano, é urgente e necessário à implantação de um modo de desenvolvimento justo, sustentável e (por que não?) afetuoso, em uma época de exaustão do modelo social vigente.

As perversidades das quais somos vítimas, vez em quando, fazem pouco caso ou ridicularizam os encontros, numa concepção biocêntrica de comunhão generosa e como um meio supremo de perceber o outro. Martin Buber, Leonardo Boff, Pierre Weil e outros tantos dialogam com a proposta. Do Saber Cuidar, obra relevante de Boff, numa contribuição valiosa à sustentabilidade do planeta e das relações, às lições do mestre chileno.

Quantas tragédias não poderiam ter sido evitadas com a inserção  significativa e determinante do imprescindível ingrediente amoroso na educação de tantos que, num golpe violento, ceifam suas próprias possibilidades de um destino melhor? Longe de parecer devaneio hedonista, a Biodança é um apelo mundial a uma concepção coletiva, em uma dança dos encontros, de harmonia e afetividade. Nestes tempos em que grande parcela da humanidade parece, irremediavelmente, voltada para seu próprio umbigo, lambendo suas chagas, há de se extirpar o egoísmo em série e a crueldade individualista, em nome da salvação da nossa espécie. Nem que, para isto, precisemos repetir Afonso Romanno de Sant’anna: “Sejamos delicados, cruelmente delicados!”










Cinema e Psicanálise

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

21 DE NOVEMBRO: A CELEBRAÇÃO


A frase emprestada não tem prazo de validade para quem se ufana de ter sorte na vida. Adiciona-se a ela o devido reparo gramatical  e a ventura de nascer filha de dois professores da Língua Mãe!

21 de novembro: evoé, Baco!


"Gracias a la Vida que me ha dado tanto".
(Mercedes Sosa)


terça-feira, 16 de novembro de 2010

Cinema e Direitos Humanos


Confira a Programação no Cine Praia Grande





29/11 – SEGUNDA-FEIRA


19h30 - Sessão de Abertura


VIDAS DESLOCADAS


João Marcelo Gomes (Brasil, 13 min, 2009, doc)


PERDÃO, MISTER FIEL


Jorge Oliveira (Brasil, 95 min, 2009, doc)


30/11 – TERÇA-FEIRA


13h30 - A VERDADE SOTERRADA


Miguel Vassy (Uruguai/ Brasil, 56 min, 2009, doc)


ROSITA NÃO SE DESLOCA


Alessandro Acito, Leonardo Valderrama (Colômbia/ Itália, 52 min, 2009, doc)

15h30 - ENSAIO DE CINEMA


Allan Ribeiro (Brasil, 15 min, 2009, fic)


Renate Costa (Paraguai/ Espanha, 91 min, 2010, doc)


17h30 - A BATALHA DO CHILE IIO GOLPE DE ESTADO


Patricio Guzmán (Chile/ Cuba/ Venezuela/ França, 90 min, 1975, doc)

19h30 - ABUTRES


Pablo Trapero (Argentina/ Chile/ França/Coréia do Sul, 107 min, 2010, fic)


03/12 – SEXTA-FEIRA


13h30 - DOIS MUNDOS

Thereza Jessouroun (Brasil, 15 min, 2009, doc)


AMÉRICA TEM ALMA


Carlos Azpurua (Bolívia/ Venezuela, 70 min, 2009, doc)

15h30 - VLADO, 30 ANOS DEPOIS


João Batista de Andrade (Brasil, 85 min, 2005, doc)


17h30 - A HISTÓRIA OFICIAL


Luis Puenzo (Argentina, 114 min, 1985, fic)


19h30 - XXY


Lúcia Puenzo (Argentina/ França/Espanha, 86 min, 2006, fic)


01/12 – QUARTA-FEIRA


13h30 - Audiodescrição


AVÓS


Michael Wahrmann (Brasil, 12 min, 2009, fic)


ALOHA


Paula Luana Maia, Nildo Ferreira (Brasil, 15 min, 2010, doc)


CARRETO


Marília Hughes, Claudio Marques (Brasil, 12 min, 2009, fic)


EU NÃO QUERO VOLTAR SOZINHO


Daniel Ribeiro (Brasil, 17 min, 2010, fic)


* Sessão com audiodescrição para público com deficiência visual.


15h30 - HÉRCULES 56


Silvio Da-Rin (Brasil, 94 min, 2006, doc)




17h30 - DIAS DE GREVE


Adirley Queirós (Brasil, 24 min, 2009, doc)


PARAÍSO


Héctor Gálvez (Peru/ Alemanha/Espanha, 91 min, 2009, fic)


19h30 - CARNAVAL DOS DEUSES


Tata Amaral (Brasil, 9 min, 2010, fic)


MEU COMPANHEIRO


Juan Darío Almagro (Argentina, 25 min, 2010, doc)


LEITE E FERRO


Claudia Priscilla (Brasil, 72 min, 2010, doc)




04/12 – SÁBADO


13h30 - MÃOS DE OUTUBRO


Vitor Souza Lima (Brasil, 20 min, 2009, doc)


JURUNA, O ESPÍRITO DA FLORESTA


Armando Lacerda (Brasil, 86 min, 2009, doc)


15h30 - HALO


Martín Klein (Uruguai, 4 min, 2009, fic)


ANDRÉS NÃO QUER DORMIR A SESTA


Daniel Bustamante (Argentina, 108 min, 2009, fic)


17h30 - MARIBEL


Yerko Ravlic (Chile, 18 min, 2009, fic)


O QUARTO DE LEO


Enrique Buchichio (Uruguai/ Argentina, 95 min, 2009, fic)


19h30 - O FILHO DA NOIVA

Juan José Campanella (Argentina/ Espanha, 124 min, 2001, fic)


02/12 – QUINTA-FEIRA


13h30 - Audiodescrição


PRA FRENTE BRASIL



Roberto Farias (Brasil, 105 min, 1982, fic)


* Sessão com audiodescrição para público com deficiência visual.




15h30 - A CASA DOS MORTOS


Debora Diniz (Brasil, 24 min, 2009, doc)


CLAUDIA


Marcel Gonnet Wainmayer (Argentina, 76 min, 2010, doc)




17h30 - ALOHA


Paula Luana Maia, Nildo Ferreira (Brasil, 15 min, 2010, doc)


AVÓS


Michael Wahrmann


(Brasil, 12 min, 2009, fic)


CINEMA DE GUERRILHA


Evaldo Mocarzel


(Brasil, 72 min, 2010, doc)




19h30 - KAMCHATKA


Marcelo Piñeyro (Argentina/ Espanha/Itália, 103 min, 2002, fic)




05/12 – DOMINGO


13h30 - GROELÂNDIA


Rafael Figueiredo (Brasil, 17 min, 2009, fic)


MUNDO ALAS


León Gieco, Fernando Molnar, Sebastián Schindel (Argentina, 89 min, 2009, doc)


Classificação indicativa: 12 anos


15h30 - CARRETO


Marília Hughes, Claudio Marques (Brasil, 12 min, 2009, fic)


BAILÃO


Marcelo Caetano (Brasil, 17 min, 2009, doc)


DEFENSA 1464


David Rubio (Equador/ Argentina, 68 min, 2010, doc)


17h30 - O ANO EM QUE MEUS PAIS SAÍRAM DE FÉRIAS


Cao Hamburger (Brasil, 110 min, 2006, fic)


19h30 - EU NÃO QUERO VOLTAR SOZINHO


Daniel Ribeiro (Brasil, 17 min, 2010, fic)


IMAGEM FINAL


Andrés Habegger (Argentina, 94 min, 2008, doc)

sexta-feira, 12 de novembro de 2010

FEIJÃO COM INFORMAÇÃO




 



domingo, 7 de novembro de 2010

Tempo de temperos ou de tempestades?


O enigma do tempo é um dos meus fascínios. A pressa pode pisotear flores. Mas a lentidão é represa na torrente de águas afoitas, abundantes, temerárias que ousam afrontar o próprio tempo. O tempo, essa bizarra dimensão misteriosa, a quem atribuem ser o velho Senhor da Razão, vez por outra, ensandecido, alucina os dias e as horas. Dele, diz ser Rei, a bela canção. E eu, rainha, a me contentar com migalhas de segundos que sobram de tantas eternidades já sonhadas, recito as palavras do Eclesiastes, um dos meus poemas bíblicos preferidos, depois de Salomão:

“Tudo tem o seu tempo determinado, e há tempo para todo o propósito debaixo do céu. Há tempo de nascer, e tempo de morrer; tempo de plantar, e tempo de arrancar o que se plantou; Tempo de matar, e tempo de curar; tempo de derrubar, e tempo de edificar; Tempo de chorar, e tempo de rir; tempo de prantear, e tempo de dançar; Tempo de espalhar pedras, e tempo de ajuntar pedras; tempo de abraçar, e tempo de afastar-se de abraçar;”

Mas qual o verbo do princípio conjugará pretéritos imperfeitos? Ou redigirá, como imperativo da alegria, o futuro do presente? Em qual tempo acontecerá o milagre da tranformação do Malbec em Água Perrier? A conversão do mármore em mel? Tempo de temperos e semeaduras? Ou, novamente, tempo de tempestades, que varrem a terra para surgirem novos húmos? Repilo o tempo de aconte(cimentos) petrificados. Quero o aconte-SER. Nós e os episódios somos frutas das quais a demora no tempo de colheita apodrece e o instante mágico da hora exata proporciona o sorver. A rotina asfixia os minutos. Mas o atraso e a demora também destroem o agora. A ausência é a indolência do tempo. Começo, meio e fim? Sem ponteiros no meu relógio, destruo as horas, mas acabo também com o fim.  “,” (vírgula, como faria Clarice)