“...E eu então, minha górgone, minha gárgula de Notre Dame, e eu, minha sintaxe de Deus? Você fala como falam os balões de junho de Portinari, as jóias da coroa do reino de Samarcanda, você, meu imperativo categórico, você, minha espada maçônica, você me mata! Tuas paisagens, teu subsolo infernal, teus labirintos são superiores em felicidade a qualquer declaração dos direitos do homem! A primeira vez que eu vi você naquele bar do crepúsculo eu senti que as pirâmides e as cataratas não valiam a tua unha do dedo mindinho! ”
O recorte acima, pinçado da crônica A estranha (e eficiente) linguagem dos namorados, do poeta Drummond, segundo ele mesmo seria uma “introdução (devagar com isso, rapaz!) de um projeto não-comercial de comemoração do Dia dos Namorados”. Oportuno voltar ao delicioso texto diante dos insistentes apelos publicitários nesta que dizem ser a segunda data comercial mais lucrativa do ano.
A própria Imprensa parece manter um escancarado caso de amor com a Propaganda, exibindo matérias do tipo O que dar (!) para o namorado (a) e pautinhas assim. Ora, nos tais “Cadernos Especiais”, os jornais servem à propaganda como uma boa prostituta, iguais à impagável (se é que se pode usar o termo neste ramo de negócios) cena de Débora Secco, no fllme Bruna Surfistinha: “hoje eu não vou dar, eu vou distribuir!”.
O tal 12 de junho é tão falso quanto as cantadas de qualquer conquistador barato. Ainda que gastemos os tubo$ com um presente m-a-r-a-v-i-l-h-o-s-o, um jantarzinho dos deuses e todo o kit que acompanha a fatura de qualquer relacionamento! A data foi forjada no Brasil, em 1949, pelos magazines Mappin e Clipper. Isso mesmo, Mappin, aquela loja de departamentos que faliu após um golpe praticado pelo empresário Ricardo Mansur, denunciado pela Procuradoria da República por violação à Lei 7492/86, a não menos famosa Lei do Colarinho Branco. Um típico caso de batom na cueca: indefensável. O empresário, por sinal, é pai do Rico Mansur, um pegador de primeira, já que o tema em questão permite tais digressões.
O truque da criação do Dia dos Namorados incluía o então publicitário João Dória, que estimulava os casais a trocarem de presentes às vésperas do Dia de Santo Antônio (13 de junho), santo casamenteiro. Há quem diga que Antônio ganhou fama de “casamenteiro” ao dar uma força às moças, emprestando dinheiro às que necessitam de dotes para casar.
Como se vê, de um jeito ou de outro, a grana aparece em meio às querelas de quem “gama”, como se dizia no tempo de papai. Entre outdoors obviamente exibicionistas, panfletos com ofertas variadas, promoções leve dois para jantar (e pague por três), no afã de seduzir os mal-amados ou os com auto-estima equivocada, deixo-me conquistar pelo poeta maior, autor de A Paixão Medida e Amar se Aprende Amando:
“O amor é inventivo porque anula os postulados da lógica. Os amantes se entendem sob o signo do absurdo” (Drummod)
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