sexta-feira, 8 de janeiro de 2010

Lula em versão decepada de Os dois filhos de Francisco



Fui assistir ao filme Lula, o filho do Brasil, dirigido por Fábio Barreto - felizmente em companhias tão agradáveis que compensaram a falta de bons modos da platéia. Nada mais irritante do que ser obrigada a ouvir conversas de quem comete a heresia de escolher justamente o cinema para bater papo ou tagarelar ao celular. Ah, São Luís...


Insisto em minha modesta opinião, em meio à enxurrada de postagens, artigos e comentários que, só no universo da Internet, já alcançou a marca de 2 milhões e 600 mil citações sobre o assunto. A produção, que recebeu generosas doações em torno de 10,8 milhões de reais, de empresas com negócios umbilicalmente ligados ao Governo Federal, prima pela fórmula aprimorada com requintes, nos últimos anos, pelo Cinema Brasileiro: a força da aridez da temática nordestina, pitadas de romance, mensagens de fundo com lições de auto-ajuda e o tempero essencial da emoção.

As cenas de morte da primeira esposa, o enterro da mãe, dona Lindu, magistralmente interpretada por Glória Pires, e as frases de efeito do personagem mitificado pelo filme seguem a trilha de poeira da estrada percorrida por outras personalidades reais brasileiras que triunfaram sobre as dificuldades congênitas, a exemplo de Zezé de Camargo e Luciano. Lula, o filho do Brasil é uma versão decepada de Os dois filhos de Francisco. Nenhuma alusão depreciativa ao acidente de trabalho sofrido pelo ex-operário. Excluindo-se da análise o fenômeno da popularidade do Presidente, o Lula desidratado da produção da família Barreto já se encontra distante léguas e léguas do nordestino de Garanhuns, inchado pelas alianças com a banda podre da política brasileira. Uma biografia atípica, de torneiro mecânico a Presidente do Brasil, sob ângulos e enquadramentos da técnica cinematográfica, até dispensaria um roteiro primoroso.

Apesar da prioridade declarada ao realismo documental com heroísmo típico de ficção no argumento, das frases alteradas para imprimir cores de mocinho ao personagem principal, o filme é fiel ao perfil de um líder degradável à Ditadura Militar (foi preso no DOPS, mas não exilado). O trainee de Lula, retratado em algumas sequências de cenas já revela o Lula profissional, especialista na arte da resiliência política do Lulismo. “Trabalhador não é de direita, nem de esquerda”, “Puxei a bondade de minha mãe e a maldade do meu pai”, disse o personagem de Lula, o filho do Brasil. A apologia à obstinação é um trunfo que se alastra até na vida pessoal do jovem Luiz Inácio. Bem melhor do que as metáforas de péssimo gosto em seus discursos oficiais, ele conquista Dona Marisa com a frase: “O amor só acontece uma ou duas vezes na vida, no máximo”. Uma bela história de amor para deleite proposital de milhares de brasileiros que vivem em condições de drama. Real e não fictício.






Um comentário:

  1. Achei bem interessante o comentário. Em relação à comparação com o filme "Os Dois Filhos de Francisco", o que temos neste á a luta para chegar ao estrelato, no de Lula é a questão da sobrevivência. A história tem uma crueza comovente nem precisaria ser pincelada com apelos emocionais, mas trata-se de contar no cinema e aí qualquer realidade torna-se diluída.

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