terça-feira, 5 de janeiro de 2010

SEMENTE: SE MENTE... SEM MENTE!



“A vida tem horror à mesmice. Um amigo, cientista especialista em bambus, me emprestou um livro-arte maravilhoso sobre bambus. Aprendi que os bambus florescem. Espantei-me. Eu nunca vi um bambu florido. Bambus, pelo que eu pensava saber, se reproduzem assexuadamente: a planta mãe vai soltando brotos iguais a si mesma. Mas o livro me disse que em períodos aproximados de cem anos, uma mesma espécie de bambu floresce, no mundo inteiro. Depois da orgia sexual, da troca de gens, da ejaculação de sementes, morrem os bambus. Os novos nascerão das sementes. Não serão mais os mesmos que eram. Porque a semente é precisamente isso: a vida se recusando a ser a mesma; a vida sabendo que, para continuar viva, precisa deixar de ser o que era para vir a ser uma outra coisa. Se não houver a mistura de gens, se a planta quiser ficar sempre a mesma, ela se degenera. É preciso deixar de ser o mesmo e se transformar em outro. Vale para as plantas a sabedoria evangélica: Quem quiser salvar a sua vida perdê-la-á. Quem permanecer o mesmo, morrerá. Ou se transformará numa pedra. Na procriação existe sempre um pouco de morte. Morre e transforma-te!, dizia Goethe. Somente onde há sepulturas há também ressurreições, dizia Nietzsche. Se o grão de trigo, caindo na terra, não morrer, fica ele só. Mas se morrer dá muito fruto, dizia Jesus.”

(Texto de RUBEM ALVES, escritor, teólogo e psicanalista)



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