segunda-feira, 25 de abril de 2011

A bela e a fera


No famoso conto, a bruxa malvada, escondida sob a aparência de rainha, indaga: “espelho, ó espelho meu, existe no mundo alguém mais bela do que eu?” Extasiado diante de sua própria imagem refletida, Narciso se atira para a morte no lago. No outro Lago, o dos Cisnes, o príncipe também se joga e morre afogado em águas turbulentas, após ser vítima de embustes e feitiçarias. É  a morte do amor pela ilusão. Em O Retrato de Dorian Gray, de Oscar Wilde, a obsessão pela juventude e a beleza eternas acabam de modo trágico, após anos de pecados e crimes escondidos na pintura de um quadro.


O espelho e seu reflexo - a imagem - contém a força de elementos de ampla significância no terreno pantanoso das concepções de si mesmo e da respectiva subjetividade de cada um. Uma frase da escritora francesa Anais Nïn oferece pano para a manga do tema: “Não vemos as coisas como são. Nós a vemos como somos”. Adiciona-se à polêmica a miopia generalizada que costuma afetar todos nós, inclusive a esta que escreve.


Diante do exposto, a pergunta Quem eu sou? parece esconder o sentido original de Como eu me vejo? Ou Qual imagem que enxergo refletida em meu espelho? A metáfora do espelho traz em si a condição de não ser real. Imagens deformadas, ampliadas ou reduzidas preenchem os nossos campos de visão e surgem, frequentemente, no doloroso processo de auto-conhecimento. No livro Auto-Engano, Eduardo Giannetti alerta ainda no prefácio: “a relação mais íntima, traiçoeira e definidora de um ser humano é a que ele trava consigo mesmo”.


Quem já viveu a experiência pessoal e intransferível de descer os degraus até o subsolo de si mesmo em terapia, sabe o quanto é necessariamente doloroso encontrar consigo mesmo, enxergar-se, sem maquiagens, truques ou ilusionismos. Não raro os que têm a coragem de ir adiante se deparam com a feiúra nua e crua da alma. A escritora tcheca Monika Zgustova, já citada numa antiga postagem deste blog, adverte: “Portar máscaras durante longo tempo estraga a pele.”


Rubem Alves, no livro A Festa de Maria, incrementa o debate: “De todos os espelhos, a tristeza é o mais fiel. Vão-se as máscaras, as dissimulações, as linhas que os sentimentos mesquinhos cortam na pele e nos fazem feios”. O texto, porém, é alentador ao mencionar que “é no espelho da tristeza que a nossa beleza surge”. Na fábula A Bela e a Fera, ao final da história, o monstro se transforma em um belo príncipe, depois de receber um beijo da princesa que o amava muito além de sua aparência.
















2 comentários:

  1. Quem é a bela e quem é a fera, Vinha?
    Bjs, Marcinha

    ResponderExcluir
  2. Elas moram dentro de cada um de nós, minha querida!
    Um grande abraço.

    ResponderExcluir