No carnaval de 2009, escrevi que estava em plena semana santa. Dona do meu próprio calendário subversivo, adotei, nos últimos anos, o estranho hábito de transgredir as efemérides. Na maioria das ocasiões de comemorações coletivas, enquanto os micos amestrados e soldadinhos de chumbos vestem as mesmas roupas, grunhindo suas felicidades obrigatórias, percorro o caminho inverso. Já passei Reveillon na mais completa casmurrice, em companhia apenas da finada Capitu, antiga gata siamesa de estimação da minha família, e vários feriados em ilhas - não as desertas e afrodisíacas, mas as gélidas ilhas de edição.
Sobre essas emoções espalhafatosas do período momesco, feitas de máscaras e materiais descartáveis (que integram a composição, inclusive, de alguns chamados amores de carnaval), prefiro adotar para meu consumo interno a definição da escritora Adriana Falcão, em seu maravilhoso Mania de Explicação: “Alegria é um bloco de carnaval que não liga se não é fevereiro”. Sem intuito algum de ser xingada pela colegagem que se esbalda na folia, aviso aos que ainda não sabem: o meu baile de carnaval começou antes mesmo da minha vinda a este Vale de Lágrimas, durante a minha concepção, segundo relato desavergonhado do meu próprio pai, que conta ter me feito após uma festa no antigo Clube Jaguarema, ainda nos primeiros meses de lua de mel com mamãe. Eu, afobada, não queria esperar muito para vir desfilar e cantar meu samba enredo aqui nesse mundo.
Adepta dos freqüentes retiros espirituais aos quais me submeto, prefiro as farras domésticas, as alegrias na minha abadia, as festas no meu mosteiro. Embora o simbolismo contido na abadia e no mosteiro onde costumo me esconder, aos que consideram incompatível a alegria no ambiente do claustro, dois dos maiores expoentes da Espiritualidade consideram a necessidade de tal estado de espírito. São João da Cruz dizia que “a alegria é o sol das almas”. Santa Teresa D´Ávila , intensa, extraordinária, mencionava: “Senhor, livrai-me dos santos carrancudos”. Na perspectiva de um movimento emocional do interior para o exterior, o gênio Guimarães Rosa ensinava: “Deus nos dá pessoas e coisas, para aprendermos a alegria. Depois, retoma coisas e pessoas para ver se já somos capazes da alegria sozinhos.” Em A Festa de Maria, o escritor e psicanalista, Rubem Alves, também ensina: “A alegria é um pássaro que só vem quando quer. Ela é livre. O máximo que podemos fazer é quebrar todas as gaiolas, é cantar uma canção de amor, na esperança de que ela nos ouça”. Um pássaro livre. Um pássaro verde, eu diria, utilizando aquela velha expressão de quem “viu passarinho verde”.
Eita, mas como é difícil postar um comentário, Flavita.
ResponderExcluirPaulo Cruz
Ah,já que consegui finalmente postar comentário, não vou deixar de dizer que adorei o texto do Passarinho Verde. Uma "viagem" maravilhosa.
ResponderExcluirPaulo Cruz
Vinha, minha "pássara" multicor...Eu te amo, frô frondosa. Lindo texto.Como sempre.Bj azul p tu
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