sexta-feira, 22 de julho de 2011

Via de pressa!


Há alguns anos, entusiasmei-me com a obra A Terceira Margem – em busca do Ecodesenvolvimento, de Ignacy Sachs - um mix de autobiografia, observações extraídas de sua aguda percepção da multiculturalidade planetária (ele morou no Brasil, Índia, vive em Paris desde 1968) e elaboração de ideias, com acuidade ímpar. Economista polonês, Sachs, percorreu caminho inverso às doutrinas neoliberais e criou o conceito de ecodesenvolvimento ou desenvolvimento includente, uma recusa lúcida e irreverente em aceitar que o desenvolvimento possa surgir, unicamente, por meio da via econômica. O intelectual chuta o balde do americanismo, evidenciado na expressão do marqueteiro de Clinton, James Carville: “É a economia, estúpido!”
A vitalidade de pensamento de Sachs é impregnada de ânimo na abordagem da inadiável questão da sustentabilidade. Ao trabalhar o ecodesenvolvimento no Terceiro Mundo, o autor diz que foi “impossível não se debruçar sobre a questão da hipertrofia urbana, da proliferação das favelas e dos bairros periféricos precários”.

O tema Favela tem despertado especial interesse em mim, já tendo adiado um projeto de pesquisa sobre o assunto, por alguns anos, possibilitando-me um olhar mais atento às tragédias enfrentadas, diariamente, pela população periférica de São Luís. Penso em Sachs todas as vezes em que leio  notícias de “quilômetros que serão asfaltados” pelo Poder Público a vagar, feito as carruagens de Ana Jansen, pela minha cidade e pelo meu Estado. A indignação me esmurra quando, ao sair de casa cedo, percebo a “genial” solução encontrada pela Prefeitura para resolver o problema dos engarrafamentos nas rotatórias: cones.  Ou, ao ouvir o locutor forasteiro dizer que a Via Expressa do Governo do Estado é uma “homenagem pelos 400 anos de São Luís” – em peças cuja ausência de conceito publicitário evidencia mais a “bondade governamental”, ao oferecer um “presente” aos maranhenses, do que a questão urgente do futuro da cidade.

Ora, até os bêbados do Abrigo da João Lisboa sabem que asfalto e concreto são repetidamente jogados, há décadas, em nossas avenidas e ruas, pelos sucessivos prefeitos, sem que nenhuma mudança estrutural tivesse ocorrido, de fato, nos últimos 40 e poucos anos. Um conhecido deputado federal já dizia: Tadeu Palácio como prefeito foi um ótimo jardineiro!
A apologia ao tal desenvolvimento do Maranhão é feita desde o tempo em que Sarney ainda não possuía tinta nos bigodes. Os elementos da retórica desenvolvimentista local, “Porto do Itaqui”, “siderúrgicas”, “refinarias”, “milhares de empregos que serão gerados”, são refrões surrados de uma velha canção, que desafina diante do côro da imensa legião de miseráveis. No livro já citado acima, Sachs provoca: “Que dizer do crescimento econômico, mesmo forte, que se dá aprofundando as desigualdades sociais?”

Para ele, toda cidade é um ecossistema, ao “dispor de um potencial de recursos desperdiçados, mal utilizados, latentes”. O conceito reside a quilômetros de distância das políticas públicas capengas, elaboradas pelos gestores maranhenses. Vivemos em um município fragmentado, que cresce de maneira desordenada, sem o incentivo às iniciativas criativas e originais. O polonês cita como exemplo uma experiência em Curitiba em que a prefeitura pagava em forma de passagens de ônibus os sacos de lixo levados pelos moradores.
Uma das melhores produções sobre a questão urbana em São Luís foi o filme produzido por Diogo Pires Ferreira, a reflexão: Resgatando velhos conceitos para o futuro da cidade. Entre os diversos aspectos abordados, o mais simples de todos e não menos essencial: são poucos os locais da capital do Maranhão onde é possível comprar pão a pé. A dependência do carro na cidade é proporcional ao isolamento por muros, pelas grades dos condomínios e dentro do ar-condicionado, enquanto lá fora se discute o aquecimento global. Em um artigo publicado no jornal Vias de Fato, chamei de a “barratijucatização de São Luís”.
Às vésperas de mais uma eleição municipal, que o vídeo sirva de reflexão aos responsáveis pela elaboração das políticas públicas,  com o cacoete de atropelar o fator humano e de tentar resolver a complexa questão urbana com asfalto e concreto.


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