A ausência da escrita em quem faz dela um ingrediente vital é uma ausência de si mesmo. Pessoas, Clarices e outros mitos literários enfrentaram tal drama, nos seus momentos de insuficiência. Não se bastam os que recorrem à palavra, não são suficientes, somente a linha da escrita os preenche. O ato de escrever – ainda que se constitua um constante vir a ser, processo impermanente e inacabado por essência - tem o poder de demarcar territórios, de fundação das pequenas cidades feitas de nossas concepções, do estabelecimento das próprias leis, do arquitetar de sentimentos, do projetar ruas, avenidas e vielas por onde deverão trafegar nossos pontos de vista e de todo um movimento no sentido de quem ousa ser deus.
Sim, escritores são semi-deuses de suas próprias palavras, estas flechas poderosas, emitidas por arqueiros que escrevem, aliando força e habilidade, precisão e emoção e, sobretudo, com pulsação. Palavras também podem ser como pincéis: tons pastéis ou vermelho hemorrágico, abstracionistas, expressionistas, em textos sisudos ou desavergonhadamente exibicionistas.
Ainda que incontestável seja assim, alguns dias têm aspecto de musgo. A criação assume forma de pedra. As engrenagens enferrujadas dos ofícios repetitivos corroem a liberdade e condenam à morte a vida sob a asfixia da rotina. Mas os que sobrevivem como portadores de uma familiar compulsão pelo dito-escrito não conseguem, por muito tempo, permanecer sob a tirania da obviedade estabelecida. A rotina é letal. As letras são meu antídoto, palavras são meu “veneno antimonotonia”. Com elas, a vida volta a dançar!
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