terça-feira, 30 de agosto de 2011

Breves confissões adocicadas


A poesia distraída de certas canções deságuam sensações de céu. Um dos meus versos musicais preferidos é aquele de Chico Buarque, em Lola: “Gosto de ver você chegar, arrancando páginas  dentro de mim”. 
Um sorriso despertado pela cumplicidade de certas lembranças agradáveis, sedutoras, surge quase pedindo sua conversão em escrita. Contemplo as primeiras luzes que riscam a paisagem de concreto, em janelas que exalam vidas acesas, impondo sua presença, em meio aos vestígios do azul de um resto de dia. Entardece lentamente, lenta a mente. Persianas entreabertas deixam escapar aromas do início de noite. Um rio de águas mansas, mornas passeia na alma, antes insaciável, em estado de permanente torrente, jorrando em desperdício absoluto. O singelo, a delicadeza, a alegria despretensiosa tomam assento no lugar abandonado, após anos de ardor, de ânsias juvenis, de frenesis imbecis.
A calmaria é brisa suave no rosto, beijo gostoso que se delicia desde a espera. A mansidão é música feita de punhos de rede. Hermeto Pascoal de minhas emoções reinventadas. Fluir, mergulhar, no baile do ritmo da harmonia soberana. Transformar em arte cada parte. Vik Muniz de mim mesma, reciclando intenções e emoções. Do meu lixo interior ao papel da poesia. Viver certos dias que se parecem com uma caminhada à beira-mar, pressa que desaparece, maré cheia, maré vazante, ciclos naturais. Vida que não impede o sol de nascer, a chuva de cair, o mar de encher ou vazar. A mestra natureza, ao ensinar a receber a semente, fazer crescer, florescer, amadurecer, num tempo, nem atrás, nem adiante, mãe de todos os acontecimentos.
Acordar, a cada dia, como quem nasce novamente. O interior em pluma, ao abrigo das cobertas da serenidade. Nem os ruídos urbanos, nem a despedida do vento de agosto serão capazes de desafinar a ternura, armadura de lençol. O cheiro de maresia está no ar.

segunda-feira, 29 de agosto de 2011

Instinto de Fêmea

Das perversidades planetárias da atualidade, a situação dos 440 mil refugiados da Somália é, provavelmente, a mais atroz de que se tem notícia. Famílias inteiras cruzando o deserto para fugir de um cruel inimigo, produzido pela mais grave das chagas morais da humanidade: a fome – principal produto do egoísmo na Terra.

Qualquer comoção diante da sucessão de tragédias suportadas pelos somalis assume dimensões de um soco no estômago. Acompanhar o noticiário daquele submundo equivale a  sentir o cinismo da espécie dita “civilizada”. De todas as informações, algumas se sobressaem como vísceras expostas.

A ausência de choro nas crianças ocorre em decorrência do avançado estado de desnutrição. O mais básico instinto infantil, a primeira e mais elementar forma de expressão humana desapareceu, por completo. "Ela tem muita fome, mas acho que ficou fraca demais para chorar", diz uma das mães, Shukri Mohamed, de 28 anos, embalando seu bebê de oito meses, segundo relato do jornal Folha de São Paulo, que, textualmente, descreve: Pele e osso, a criança tem os olhos vidrados, indiferente ao bando de moscas que passeiam sobre seu rosto.

Outra face da crise humanitária que chama a atenção: à frente da migração compulsória de milhares de pessoas que fogem da fome estão mulheres e não homens ou líderes. Dos 440 mil refugiados no campo de Dadaab, 80% são mulheres, crianças e idosos. As mulheres são responsáveis por garantir a sobrevivência de suas famílias. Os homens ficaram para trás - ou porque foram forçados a lutar na guerra ou porque alegam que precisam proteger suas propriedades e animais. Eles não admitem perder seus bens materiais. Embora de menor importância, o detalhe escancara, em contraponto, o instinto básico, feminino: o cuidado, a proteção, a nutrição - em uma escala de valores completamente diferente da maioria dos machos.

Numa folheada rápida, este final de semana, no livro da escritora americana Susan Sontang, Olhando a Dor dos Outros, observei o relato de uma troca de cartas entre um advogado inglês e a romancista britânica Virginia Woolf. O advogado considerava as possibilidades de prevenir o começo das guerras. Woolf respondeu que guerra era coisa de homens, que gostam de guerras, em troca da gloria e da satisfação em lutar, emoções de pouca ressonância no psiquismo feminino.

Além de assistirem à esqualidez de seus rebentos secos pela fome, as mulheres da Somália ainda enfrentam outra crueldade, os frequentes ataques de estupros. Segundo o Internacional Rescue Committee, os casos multiplicaram-se por quatro desde maio. Entre janeiro e junho, foram registrados 358 casos – mais de 2 por dia e nenhuma punição.

Mulheres são criaturas que a Divindade escolheu para alojar a espécie humana no santuário do próprio ventre. Tal condição é suficiente para descrever a subjetividade feminina e dispensa maiores teorizações. Fêmeas desprovidas do sentimento de proteção, de atenção e de cuidado deveriam usar cuecas.

quinta-feira, 25 de agosto de 2011

Entra... n(H)as

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terça-feira, 23 de agosto de 2011

Cart(amante)


Intensa com senso
Noção do coração
Inteira de fogueiras
Entre a tez e a luci...dez
Noites crivadas de di(amantes)
Outrora em falsos brilhantes
Aurora em vestido de pólvoras
Na festa pela fresta
A anfitriã do destino
Desvia o desatino
Dita as regras
E rasga as cartas





domingo, 21 de agosto de 2011

Pelo respeito à Vida Sagrada


quarta-feira, 17 de agosto de 2011

AGENDA DA ALMA


segunda-feira, 15 de agosto de 2011

Argumento

Bilhete de Navegação



Mantra do sábio Paulinho da Viola, em sua interpretação e letra da música Argumento, adicionado, há alguns meses, no meu mapa de vôo pessoal: “Seja como um velho marinheiro, que durante o nevoeiro, leva o barco devagar”.
A calmaria e a serenidade são virtudes adquiridas e aperfeiçoadas, ao longo de muitos temporais. A certeza é âncora necessária, após longas rotas percorridas. Entre tantas chegadas e partidas, em meio à sucessão de nevoeiros, tempestades - intercaladas por paisagens excepcionais no amanhecer e anoitecer da temerária aventura humana – os nossos princípios são bússula a guiar o barco, da qual jamais se deve prescindir ao ousar atravessar o oceano.
Embora sob a composição da água, fluídica por natureza, aprecio a firmeza das rochas. A frouxidão emocional, a displicência afetiva, a deslealdade estelionatária não despertam indignação juvenil nos velhos marinheiros, mas um profundo lamento, quase um desdém.
Navegar, nem sempre por águas tranqüilas, é arte, um permanente exercício de equilíbrio, ajuste e aperfeiçoamento aos que se recusam à paralisia do cais do porto. Os ventos fortes, a brisa suave, a direção, as mudanças climáticas a exigirem atenção e adaptação a todo instante. Velejadores fracos e negligentes costumam não realizar as grandes travessias e, comumente, são engolfados pelas ondas mais furiosas. Outros, afoitos, são incapazes de apreciar a espetacular viagem que se traduz na preciosidade de aprender a navegar. A sabedoria surge durante a travessia. Chegar talvez seja o menos importante. Fernando Pessoa, quiçá, diante do Tejo, elaborou seus versos por tal razão: 

“Navegar é preciso. Viver não é preciso”.
Navegar pela imensidão de possibilidades. A sensação de ter o controle do próprio leme, de saber onde se quer chegar, de seguir a rota indicada pela bússula dos nossos princípios, é confortadora. Ainda que ocorram imprevistos desagradáveis, tempestades e o cântico traiçoeiro das sereias. 
Única, inigualável é a sensação de Ulisses ao voltar para os braços mansos de sua Penélope. Navegar é necessário e certas paisagens, durante a travessia, são extraordinariamente belas.

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

Posologia da Profissão



"Porque o jornalismo é uma paixão insaciável que só se pode digerir e humanizar mediante a confrontação descarnada com a realidade. Quem não sofreu essa servidão que se alimenta dos imprevistos da vida, não pode imaginá-la. Quem não viveu a palpitação sobrenatural da notícia, o orgasmo do furo, a demolição moral do fracasso, não pode sequer conceber o que são. Ninguém que não tenha nascido para isso e esteja disposto a viver só para isso poderia persistir numa profissão tão incompreensível e voraz, cuja obra termina depois de cada notícia, como se fora para sempre, mas que não concede um instante de paz enquanto não torna a começar com mais ardor do que nunca no minuto seguinte."

sexta-feira, 5 de agosto de 2011

Quitanda do Quintana

quarta-feira, 3 de agosto de 2011

À Nossa Senhora das Meninas Más

terça-feira, 2 de agosto de 2011

Mistério da Torta: a Reta




Mistérios, véus, fios labirínticos entrelaçaram-me por séculos
Sinuosidades seduziam à exaustão.
O obscuro era meu álibi no combate ao obtuso
Sher(lock) Holmes at home
Homero em mero desespero.
Matas fechadas. Ruas estreitas.
Arquitetura Irreal.  
Decifra-me ou eu demoro!
No entanto, não mais nem tanto.
Tanto faz nunca fez.
Nem talvez.
Na seta da assertividade
Certas rotas são retas.
Risíveis, porém irreversíveis.